Empresas do setor de telecomunicações conseguiram, no Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro (TJ-RJ), suspender a cobrança de adicional de 4% de ICMS destinado ao
Fundo Estadual de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais (FECP) – mantendo
apenas a alíquota geral de 18%. As decisões foram dadas em antecipações de tutela
(espécie de liminares). São as primeiras que se têm notícias.
A principal alegação nos processos é de esse adicional, estabelecido pelo Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), não poderia ser cobrado dos
serviços de telecomunicação, que são essenciais – e não “supérfluos”.
Pelo artigo 82, o financiamento desses fundos de combate à pobreza somente pode
ser feito por meio de adicional sobre “produtos e serviços supérfluos”.
Com a edição da Lei Complementar nº 194, de junho de 2022, que reconheceu o
caráter essencial do serviço de telecomunicações e energia elétrica, alguns Estados
como Maranhão, Paraná, Rio Grande do Norte e Tocantins deixaram de cobrar o
adicional. Bahia e Rio de Janeiro, porém, continuaram a exigir o pagamento.
No Rio, esse posicionamento a favor da cobrança foi formalizado na Solução de
Consulta nº 6108/2022, oriunda de pedido formulado pelas empresas TIM,
Telefônica, Garliava, Fibrasil, Telxius, Claro, Nextel, Telmex, Oi e Algar. A fiscalização
do Estado fixou o entendimento de que os serviços de telecomunicação seguem
sujeitos ao FECP, mesmo após a edição da lei complementar 194.
Com esse posicionamento, algumas empresas resolveram entrar com ações
preventivas para discutir o tema. Além da edição da lei complementar 194, alegam
que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou os setores de energia e
telecomunicações como essenciais.
Em 2021, o STF determinou, em repercussão geral, a redução de alíquotas gerais
desses setores, que em alguns Estados chegaram a 25%. No julgamento, os ministros entenderam que não seria possível estabelecer uma distinção de alíquotas
para serviços considerados essenciais (RE 714.139). Estados que cobravam 25%
terão que voltar a adotar, a partir de 2024, alíquotas de 18% ou 19%.
No TJRJ, os desembargadores analisaram recursos de duas empresas que tiveram
seus pedidos negados em primeira instância. Em uma das decisões, a relatora,
desembargadora Ana Cristina Nascif Dib Miguel, da 7ª Câmara de Direito Público,
entendeu que a probabilidade do direito está demonstrada, “uma vez que o serviço
de comunicação é considerado essencial e não supérfluo”.
Ela também destacou que, com a Lei Complementar nº 194, de 2022, os serviços de
energia elétrica e de comunicações são considerados essenciais, indispensáveis e
não podem ser tratados como supérfluos. E reforçou que essa interpretação
também está presente no julgamento do Supremo (processo nº 0090455-
06.2023.8.19.0000).
O outro recurso foi analisado pela 1ª Câmara de Direito Público. De acordo com o
relator, desembargador relator Alexandre Teixeira de Souza, a lei complementar
incluiu o artigo 18-A no Código Tributário Nacional (CTN) e o artigo 32-A na Lei
Complementar nº 87/1996 (Lei Kandir), dispondo que os serviços e operações
relativas à comunicação e energia elétrica são considerados essenciais e
indispensáveis.
“O tratamento legal dado aos serviços e operações descritas nos artigos citados, os
elevaram a categoria de essenciais e indispensáveis, afastando a caracterização de
supérfluos”, diz.
Para o advogado Raphael Caropreso, sócio do Veirano Advogados, que assessora as
empresas, essas primeiras decisões vão direto ao ponto. Depois do julgamento do
Supremo e da Lei Complementar nº 194, afirma, “é público e notório que os serviços
de telecomunicação e energia são considerados essenciais”.
Ele acrescenta que existe uma lógica na desoneração de bens essenciais, uma vez
que são fundamentais para os todos os cidadãos, desde os mais pobres até as
classes altas. “Onerar esses serviços acaba por sobretaxar as classes mais baixas”,
diz.
De acordo com o advogado Tiago Conde, sócio do Sacha Calmon Misabel Derzi
Advogados, esses pedidos têm sido recorrentes no Judiciário, após o julgamento do
Supremo. Porém, afirma, nem todos os juízes aceitam suspender a cobrança do
adicional, por entender que depois a empresa pode pedir restituição, caso tenha
uma decisão favorável definitiva. “Porém, como esse tipo de tributo é repassado,
quem arca é o consumidor que continua pagando mais caro por serviços essenciais”,
diz.
Conde lembra que existe um comando normativo na Constituição (ADCT) que é claro
ao afirmar que esse adicional só deve ser cobrado sobre produtos e serviços
supérfluos e o Supremo já explicitou sobre a essencialidade desses serviços. “São
considerados serviços essenciais porque não conseguimos viver sem esses serviços.
Ainda que seja uma pessoa muito pobre, hoje em dia ela não consegue viver sem
energia elétrica e sem se comunicar”, afirma.
Cobrar esse adicional desses serviços essenciais, segundo o advogado, caracteriza
uma violação a um dos princípios da tributação, que é o da capacidade contributiva.
“Acaba onerando aquele que menos pode contribuir.”
Procurada pelo Valor, a Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE-RJ)
informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que vai recorrer das decisões do
TJRJ.
Fonte: Valor
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