Com o objetivo de aprimorar a eficiência na recuperação de créditos públicos, a Lei Complementar 208/2024 (LC 208/2024) trouxe relevantes alterações na securitização da dívida ativa e na interrupção do prazo prescricional para a cobrança dos créditos tributários. A falta de regulamentação, entretanto, deixa o contribuinte em alerta sobre a efetividade da lei, que não pode se tornar um instrumento de arrecadação a qualquer custo.
Com a nova lei, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios podem ceder, de forma onerosa, direitos creditórios decorrentes de créditos tributários e não tributários em favor de pessoas jurídicas de direito privado e fundos de investimento regulados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
A cessão dos créditos públicos poderá ocorrer por meio da venda direta pelo ente da federação, mediante processo licitatório, ou por intermédio de sociedade de propósito específico (SPE), instituída para essa finalidade. Importante destacar que apenas os créditos já constituídos e reconhecidos pelo devedor ou contribuinte (parcelamento, por exemplo) poderão ser objeto da securitização.
Multiplicidade de credores e previsão legal
Um ponto que merece a atenção dos contribuintes e devedores é o fato da multiplicidade de credores, que certamente não medirão esforços para a cobrança e recebimento dos créditos públicos adquiridos, podendo incorrer em abusos aos direitos dos contribuintes.
Nos termos da LC 208/2024, a cessão será definitiva e preservará a natureza do crédito, mantendo as suas garantias e privilégios, bem como assegurando que a cobrança do crédito continue sendo prerrogativa da Fazenda Pública.
Para coibir o uso político dos recursos recebidos, essas operações devem ser autorizadas por lei específica de cada ente federativo, e efetivadas em até 90 dias antes da data de encerramento do mandato do chefe do Poder Executivo.
Protesto extrajudicial e interrupção da prescrição
Outra novidade trazida pela LC 208/2024 foi a inclusão do protesto extrajudicial como causa de interrupção da prescrição para a cobrança do crédito tributário, alongando o prazo que o Fisco possui para cobrar as dívidas fiscais. Essa medida fortalece as ações administrativas e os mecanismos de cobrança, proporcionando mais tempo e eficácia na recuperação de créditos tributários.
Isso porque, na prática, o protesto extrajudicial causa bastante incômodo ao devedor, que passa a sofrer uma série de restrições financeiras, tais como, dificuldades na movimentação de conta corrente, aquisição de crediário, empréstimos ou financiamentos.
Requisição de informações
Por fim, a partir da publicação da LC 208/2024, a administração tributária tem a prerrogativa de requisitar informações cadastrais e patrimoniais de contribuintes a órgãos públicos e privados, aumentando a eficiência na recuperação de créditos.
Tal medida não significa a mera colaboração no compartilhamento de informações, mas a obrigatoriedade, inclusive das entidades privadas, do fornecimento de dados fiscais tidos como sigilosos.
Essa questão merece uma cuidadosa regulamentação, estabelecendo limites claros e mecanismos de controle para evitar abusos e garantir a proteção dos direitos dos contribuintes, de maneira que as informações sejam utilizadas adequadamente e nos estritos termos da lei.
Isso porque, além da inviolabilidade da intimidade, da vida privada e do sigilo de dados, devem ser respeitadas as diretrizes da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), de observância obrigatória pelos entes de direito público e privado.
Conclusão
Neste cenário, não há dúvidas de que as alterações introduzidas pela lei complementar objetivam o incremento de receitas dos entes federativos. No entanto, é imprescindível a regulamentação das questões que ainda deixam dúvidas quanto ao formato e alcance de suas aplicações, a fim de evitar o abuso por parte dos entes federados, diante das relações estabelecidas com os particulares.
O cuidado na regulamentação das questões relativas à cessão de crédito, ao compartilhamento de informações, ou à cobrança das dívidas públicas deve ser capaz de evitar novos litígios no futuro.
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