Um pedido de destaque do ministro André Mendonça interrompeu, nesta terça-feira (2/4), o julgamento do Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal sobre a validade de normas que estabelecem a redução de impostos para agrotóxicos.
Com isso, a análise do caso será reiniciada em sessão presencial, ainda sem data marcada. Até o pedido de destaque, o julgamento era virtual, com término previsto para esta quarta-feira (3/4).
A ação direta de inconstitucionalidade foi ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que alega ofensa à seletividade tributária e à proteção do meio ambiente e da saúde humana.
Um dos benefícios fiscais contestados é a redução de 60% da base de cálculo do ICMS nas saídas interestaduais de certos agrotóxicos. A ADI também questiona a alíquota zero de IPI para substâncias relacionadas a defensivos agrícolas.
Antes do pedido de destaque, oito ministros já haviam votado, divididos em três correntes de entendimento principais distintas.
Corrente de Fachin
O relator do caso, ministro Edson Fachin, votou pela inconstitucionalidade das normas fiscais. Ele foi acompanhado por Cármen Lúcia.
Ele também sugeriu a notificação de autoridades do governo federal para tomar providêcias quanto à supervisão, ao acompanhamento e à avaliação periódica da desoneração tributária do IPI.
O magistrado ressaltou que os agrotóxicos trazem riscos ao meio ambiente. Também afirmou que quaisquer benefícios devem ser voltados a práticas “consideradas menos poluentes e mais benéficas à fauna, à flora e a toda a coletividade”.
Segundo ele, “o estímulo ao uso de agrotóxicos (e o desestímulo a outras alternativas) por meio de incentivos fiscais vai de encontro ao direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”.
Além disso, os benefícios em questão são incompatíveis com o dever do poder público de proteção preventiva ao meio ambiente.
Corrente de Gilmar
O ministro Gilmar Mendes inaugurou uma corrente divergente para validar as regras contestadas. Ele foi acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes.
Gilmar explicou que os custos do ICMS e do IPI (tributos sobre o consumo) são naturalmente repassados ao consumidor final. Assim, a invalidação dos benefícios aumentaria os preços dos alimentos.
Conforme um estudo trazido aos autos, o custo da produção alimentar poderia crescer em R$ 16 bilhões, com impacto direto na inflação.
O magistrado indicou que os defensivos agrícolas são produtos essenciais no Brasil. Se não fossem utilizados, a produção sofreria uma queda de 50% e seria necessário dobrar a área atualmente cultivada, com incorporação de terras hoje cobertas de florestas.
Ele ainda ressaltou que a regulação da produção e comercialização dos agrotóxicos no Brasil é “minuciosa”.
Outro ponto destacado por Gilmar foi a demanda inelástica — ou seja, que não se altera em razão do preço.
“Os consumidores de defensivos agrícolas almejam utilizar a menor quantidade dos produtos, de modo a auferirem o maior lucro possível”, apontou. “A concessão de benefício fiscal, portanto, não gerará um incentivo ou desincentivo ao uso”.
Por fim, o ministro apontou que eventuais danos à saúde da população são insuficientes para invalidar os benefícios. “Produtos essenciais não são isentos de causarem malefícios à saúde.”
Para sustentar seu argumento, Gilmar citou uma tabela elaborada pelo Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas. Segundo ela, os agrotóxicos de uso agrícola e doméstico, somados, responderam por apenas 4,44% dos casos de intoxicação — atrás de medicamentos e produtos de limpeza domiciliar.
Corrente de Mendonça
Já o ministro André Mendonça, antes de pedir destaque, propôs uma “uma declaração parcial de inconstitucionalidade, sem pronúncia de nulidade, no conjunto normativo impugnado”.
Ele indicou a existência de um “processo de inconstitucionalização das desonerações fiscais federais e estaduais aos agrotóxicos”, já que o modelo de isenções pouco mudou desde a década de 1950.
Por isso, o magistrado sugeriu um prazo de 90 dias para que o governo federal faça uma avaliação dessa política fiscal e apresente ao STF “os limites temporais, o escopo, os custos e os resultados dela”.
Em seu voto, Mendonça lembrou que a própria Constituição “pressupõe a nocividade dos agrotóxicos à saúde humana e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como os malefícios decorrentes de seu uso”.
Por outro lado, admitiu que os benefícios contestados na ADI “ostentam finalidades legítimas”, pois estimulam a política agrícola ao diminuir os custos de produção e dos preços dos alimentos.
Para ele, o modelo atual certamente promove restrição de direitos fundamentais. Mas também não há, no momento, alternativa viável e de mesmo custo para o uso dos agrotóxicos.
Segundo Mendonça, o Judiciário não tem competência para definir a melhor solução para o problema. “Tudo recomenda que os agentes políticos e os gestores públicos competentes procedam uma consequente e responsável reavaliação da política pública isentiva ora tratada.”
O ministro Flávio Dino concordou que os benefícios fiscais questionados estão em “processo de inconstitucionalização” e acompanhou Mendonça nesse ponto, mas propôs um tempo maior para a reavaliação.
Dino votou por dar um prazo de 180 dias para que a União, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e os estados façam uma “reavaliação compreensiva, contemporânea e multidisciplinar das políticas fiscais atreladas aos agrotóxicos”, baseada em evidências científicas.
O objetivo desse processo, segundo ele, é conciliar “desenvolvimento econômico, a proteção ambiental e os direitos à saúde e à segurança alimentar”.
ADI 5.553
Fonte: Conjur
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